sábado, 15 de junho de 2013

São só 20 centavos...

São só 20 centavos, diz a âncora elegante do telejornal diário. São só 20 centavos repetem o dono da padaria, a secretária do advogado, o motorista do táxi. E esse mantra ecoa nas salas de estar dos casais de classe média, no boteco da esquina, na livraria do centro da cidade. E de tanto ser repetido, as pessoas acabam acreditando que aqueles estudantes gritando pelas ruas, gritam por 20 centavos.

Moça da TV, esses jovens gritam pelos milhões investidos em estádios milionários para que possam desfilar milionários Neymares. Gritam pelos milhões pagos a legisladores ignorantes que ignoram veementemente o povo, preocupados que estão em criar leis que os protejam do STF. Gritam para fazer ecoar o grito dos indígenas, que há tantos anos gritam sem que ninguém os escute. Gritam porque suas escolas são ruins, seus professores são mal pagos, seus pais não têm empregos e seus avós estão morrendo em leitos do SUS. Gritam porque quem deveria estar protegendo seu direito de ir e vir e de manifestar uma legítima indignação está do outro lado da rua com armas apontadas para seus rostos.

É um bando de baderneiros, diz o coronel da polícia. É um bando de baderneiros repetem o garçom do restaurante do shopping, o médico do postinho, a vendedora da loja chique de roupas. E esse mantra ecoa na barbearia do bairro, nos corredores do supermercado, na fila do banco. E de tanto ser repetido, as pessoas acabam acreditando que todos aqueles jovens gritando pelas ruas são bárbaros saídos das páginas da Historia para incendiar as urbes, estuprar as virgens e devorar as criancinhas.

Senhor coronel, não quero negar que há aproveitadores ali no meio. Vê aquele ali pichando o patrimônio público? O patrimônio que, por ser público, é meu também, é seu, é dele e de todos? Percebe aquele outro quebrando as vidraças da loja de revistas? Daquela lojinha lá cujo dono, pessoa humilde da periferia, levanta-se todos os dias às cinco da madrugada e vai se deitar perto da meia-noite? Pois é, senhor coronel, esses dois ali são agitadores, extremistas... bandidos até! Mas e os outros milhares de estudantes vestidos de branco, de cara limpa, com a palavra PAZ desenhada nos seus cartazes, nas suas camisetas, nos seus lábios e nos seus corações?

É muito triste, diz o analista político no programa famoso de TV. É muito triste, repito eu. Mas enquanto sua tristeza deriva da má impressão que os manifestantes em Brasília causam ao público estrangeiro presente para a Copa das Confederações, a minha é causada pela morte da democracia.

Eu fui jovem e lutei pelas Diretas Já. Eu fui jovem e briguei com meu pai, porque ele ajudou a eleger o Collor (fantasma que voltou para nos assombrar). Debati, discuti, estive na rua. Nunca apanhei da polícia, ainda que meus anos adolescentes tenham sido anos de ditadura (anos de transição, é verdade, mas, ainda assim, de ditadura). E agora o quê?

Desce a porrada que essa gurizada é marginal!

Não... não são só 20 centavos...

quarta-feira, 12 de junho de 2013

Quem quer ser professor?


*

Ela chora... Suas lágrimas são também minhas. São as lágrimas de todos nós, brasileiros de boa índole. A maioria dos brasileiros. Um povo que trabalha muito, que dá duro todos os dias para ter comida na mesa.

Jeitinho brasileiro? Brasileiro malandro? São poucos. Infelizmente, são eles que mandam no país. Não, por favor, não me entendam mal! Não estou dizendo que todo mandatário, todo administrador público é malandro. Mas que os mais malandros estão nestes postos... ah, qualquer negação seria vã!

As lágrimas dessa mulher não são simples lágrimas pelo salário perdido. Não são lágrimas por um corte arbitrário, abusivo, monstruoso, criminoso nos salários dos professores de Juazeiro. São as lágrimas por um país que ainda não aprendeu o valor da educação.

Lágrimas por um país em que os pais acreditam que a educação dos seus filhos é responsabilidade exclusiva dos professores. Lágrimas por um país que investe milhões de dólares em tecnologias para a educação, mas paga salários aviltantes a seus professores. Lágrimas por um país que se submete às normas internacionais de "excelência", em que conhecimento é sinônimo de nota e onde as escolas e os professores são penalizados quando as avaliações de seus alunos não alcançam tais níveis. Lágrimas por um país que exige qualificação de seus professores, mas não cria as condições necessárias para que isso se torne realidade.

Não quero vitimizar os professores. Como em qualquer profissão, há bons e maus professores. A questão é que os melhores professores ganham menos que os piores advogados ou os piores médicos. E por acaso nós, professores, somos menos profissionais ou produzimos menos que um médico ou um advogado? Não creio. Talvez, se os professores tivessem melhores condições de trabalho, precisássemos de menos médicos e de menos advogados.

Quando é que nosso governo vai realmente entender que a educação é a base da sociedade e que esta base é sustentada pelos professores? Quando é que o governo do Rio Grande do Sul vai resolver pagar o piso nacional que nega, apesar de ter sido seu atual governador um dos grandes arquitetos dessa lei? Quando é que os vereadores dos Juazeiros de nosso Brasil vão finalmente ter vergonha de tirar 40% do salário dos professores que trabalham dia e noite (sim, de noite vamos para casa preparar as aulas e corrigir os trabalhos de nossos alunos sem ganhar mais por isso) e assumir que seus salários de 10 mil reais e sua carga horária de dois dias semanais são, para dizer o mínimo, vexatórios?

E diante de todo esse quadro, especialistas ainda se perguntam por que os índices de evasão das licenciaturas hoje são tão altos e os índices de ingresso proporcionalmente tão baixos. Nessas condições, quem quer ser professor?

Em algum momento, imaginei que as coisas estavam melhorando. Agora, tocado pelas lágrimas dessa professora, só me resta fazer coro ao saudosíssimo Renato Russo: que país é este?


*Imagem disponível em http://imguol.com/c/noticias/2013/06/08/8jun2013---professora-chora-diante-da-aprovacao-da-reducao-do-salario-dos-professores-em-juazeiro-do-norte-no-ceara-o-corte-pode-chegar-a-ate-40-1370736492031_615x300.jpg